segunda-feira, 22 de maio de 2017

Mulher: mãe e médica

No mês de maio: homenagear as mulheres é fácil. Difícil é mudar comportamento do homem. Os homens surpreendem-se com a capacidade feminina de realizarem tantas tarefas ao longo do dia. Ser mulher é isso: filha, nora, tia, avó, madrinha, cunhada, esposa, mãe e profissional (médica, professora, contadora, dona de casa...). Não importa, ser mulher, no final, é se fazer presente em tarefas múltiplas - a dupla ou tripla jornada de trabalho. Começam como filhas – verdadeiras aprendizas, junto à mãe crescem com o aprendizado e preenchem de alegria a vida de irmãos e parentes, alegram os lares. Quando adultas, enfeitam a vida de filhos e maridos. Alegram a casa que ajudaram a construir. As mulheres vão mais longe, além das tarefas com filhos, casa, cônjuge... Não se esquecem do enfeite no cabelo, na blusa... Menos ainda da bolsa, dos óculos, coisas que as deixam, dia a dia, mais bonitas. Tudo isso sem perderem a sensibilidade. As coisas que sentem, que nós homens demoramos em ver, “percebem em um piscar de olhos”. Coisas sutis, como as necessidades emocionais dos que nos envolvem. Coisas sutis de nossos filhos. Necessidades que vão além das coisas físicas e materiais. Não satisfeitas, avançam na qualidade profissional.
É assim com as mulheres. É assim com a médica Fabiola de Freitas Moraes. Nasceu em Vila Velha, município capixaba “Canela Verde”– próximo ao Convento da Penha. Formada na Escola de Medicina da Santa Casa de Vitória - Emescam, em 1981. Na dúvida entre oftalmologia e pediatria, optou pelas crianças. Aperfeiçoou-se em São Paulo – Santa Casa. Chegou a Cachoeiro de Itapemirim em 1986. Quando iniciei na maçonaria, em 1992, logo se entrosou ao departamento feminino da Loja Maçônica Fraternidade e Luz. Na ocasião, médica pediatra da Prefeitura, entristecia-se com o estado de saúde das crianças cachoeirenses. Deparou-se no Morro do Corte Grande, hoje, Bairro Nossa Senhora da Aparecida, com os altos índices de desnutrição e mortalidade infantil. Os Maçons e cunhadas da Fraternidade e Luz assumiram o projeto de cadastrar, nutrir e acompanhar as crianças do bairro. Foram realizadas consultas pediátricas; distribuído, regularmente, leite e cestas básicas de alimentos. Com a integração da Pastoral da Saúde e da Infância: a pesagem, palestras de orientações para a promoção da saúde e entregas de filtros passaram a ser feitas. Foram muitos anos de trabalho, os anos da década final do século XX. A médica que permanece na pediatria, agora no Aquidabã e no Bairro Village, além do serviço em Gestão e Auditoria em saúde da rede privada (Unimed Sul Capixaba), percebe que gradativamente a desnutrição retorna em nossas crianças. São outros tempos, são passados mais de vinte anos. Outras formas de abordagem, novas experiências e condições de atendimento à saúde se apresentam. Mas, no Brasil, a fome e a miséria, essas são cíclicas – acompanham o baixo nível educacional, a baixa renda e a falta de empregos. Cabe a nós, Cidadãos e Maçons, ficarmos atentos às questões sociais. Tenho certeza que a pediatra Fabíola está muito atenta às questões que se apresentam. Fico feliz, e orgulhoso, por seu crescimento profissional e humano. Parabéns para todas as mães.




Sergio Damião Sant´Anna Moraes

Um pouco de poesia...

De Carlos Drummond de Andrade, Coração numeroso: “Foi no Rio./ Eu passava na Avenida quase meia-noite./ Bicos de seio batiam nos bicos de luz estrelas inumeráveis./ Havia a promessa do mar/ e bondes tilintavam,/ abafando o calor/ que soprava no vento/ e o vento vinha de Minas./ [...] O mar batia em meu peito, já não batia no cais./ A rua acabou, quede as árvores? a cidade sou eu/ a cidade sou eu/ sou eu a cidade/ meu amor.”

Alcoólicos Anônimos

A história dos Alcoólicos Anônimos (A.A.) começa em 1935. Na ocasião, dois homens, que o álcool havia arruinado as vidas, decidiram mudar de comportamento e estilo de vida. Com o apoio de familiares e amigos passaram a se encontrar e dividir angústias e sofrimentos. Desde então, após compreensão dos efeitos e das diferentes sensibilidades das pessoas ao álcool, formaram Grupos com necessidades semelhantes e se espalharam pelo mundo afora. A partir de uma decisão a vida mudou. Até então, as promessas eram apenas promessas. Por muitas vezes, desfeitas. Eram considerados casos perdidos. Alcoolistas: aqueles que idolatram o álcool. Um desejo imenso em seu consumo. Bastava um gole. Pronto, todas as promessas eram desfeitas. A moderação no seu consumo, o efeito de alegrar a alma, não se apresenta nos alcoolistas. Outras formas para as alegrias podem ser criadas. Nos Grupos dividiam problemas e dificuldades. Esperança para a vida futura. Viver a virtude da prudência - fidelidade não apenas ao presente, mas principalmente ao futuro. Uma esperança para outros alcoólicos “sem esperanças”.
 Hoje, são milhões de homens e mulheres espalhados pelo mundo. Nos Alcoólicos Anônimos vivem uma irmandade que compartilham experiências a fim de resolverem seus problemas comuns e ajudar outros a se recuperar do alcoolismo. O requisito para ser membro é o desejo de parar de beber. Propósito único: manter-se sóbrio e ajudar outros alcoólicos a manterem a sobriedade. Os Alcoólicos Anônimos necessitam da cooperação da comunidade; aumentar a comunicação com a sociedade. Seus membros compartilham Doze Passos e Doze Tradições para a recuperação pessoal. Qualquer pessoa pode assistir as reuniões abertas do A.A. Nós profissionais da saúde podemos cooperar. Interagir e comunicar mais. Ajudar a diminuir o sofrimento do alcoolista. Ajudar a proporcionar uma vida saudável e produtiva.  Devemos conhecer os Doze Passos: começando em ajudá-los a aceitar que são impotentes perante o álcool e que perderam o domínio sobre suas vidas. Necessitam, durante esses passos, despertar uma espiritualidade que os farão seguros dia após dia. Precisamos conhecer As Doze Tradições: iniciando-os no bem-estar comum e aceitarem a reabilitação individual através do A.A. A tradição se completa no anonimato e no alicerce espiritual. Tendo o princípio acima da personalidade. Para nós profissionais da saúde importante entender que o alcoolismo é uma doença. Doença que tem cura. Cura que depende do alcoolista. O que muitas vezes não tem cura, ou solução, são as cicatrizes que ficam no alcoolista ou em outras pessoas. Grande parte das vezes, cicatrizes formadas pela demora em aceitar o tratamento. O tratamento existe. Depende de uma decisão pessoal. Não depende de ninguém mais. Exclusivamente da pessoa. Nenhum médico possui o remédio para a cura. A cura está nas reuniões da A.A. ou na decisão do alcoolista. Telefone: (28) 3522-0648.

Sergio Damião Sant´Anna Moraes

Um pouco de poesia...

De Vinicius de Moraes, A rosa de Hiroxima: “Pensem nas crianças/ Mudas telepáticas/ Pensem nas meninas/ Cegas inexatas/ Pensem nas mulheres/ Rotas alteradas/ Pensem nas feridas/ Como rosas cálidas/ Mas oh não se esqueçam/ Da rosa da rosa/ Da rosa de Hiroxima/ A rosa hereditária/ A rosa radioativa/ Estúpida e inválida/ A rosa com cirrose/ A anti-rosa atômica/ Sem cor sem perfume/ Sem rosa sem nada.”

Transgênicos

O assunto é instigante e apaixonante. Desde os primórdios da vida na terra. Afinal, a civilização inicia-se, de fato, quando os humanos deixam de serem caçadores/ coletores/ nômades e fixam-se à terra (revolução agrícola), há mais de 10 mil anos atrás. A partir de então: formamos famílias e demos início a grandes proles e passamos a nos relacionar ativamente com astros celestes - lua e sol. Fundamos comunidades e cidades. Nos dias atuais, com a biotecnologia e engenharia genética: discutimos os alimentos, os Organismos Modificados Geneticamente (OGM) e os benefícios e malefícios dos alimentos com o DNA alterados - transgênicos. Precisamos consertar os nossos erros com o ambiente que nos cerca e alimentar a humanidade. O uso da tecnologia parece inevitável.
A cerveja, uma das bebidas alcoólicas mais consumidas no mundo, no Brasil inclusive, é um bom indicador dos caminhos da humanidade. Os indícios de sua produção remontam há 9.000 anos, na Mesopotâmia (atual Iraque); há 7.000 anos em Hunam, na China. No Egito, há 3.000 anos A.C., a cevada era considerada o melhor grão para produzir a cerveja e iniciam a produção do malte. Os Celtas produziam cerveja a partir da cevada, trigo e aveia. O Lúpulo, a flor que acrescenta aroma e sabor, foi introduzido, na Boêmia, entre o séc. XI e XIV da nossa era. Nos anos 50, do século passado, a biotecnologia inicia a revolução verde e nos anos 90 uma segunda revolução (genética) unindo a biotecnologia com a engenharia genética. Começava as grandes mudanças na agricultura mundial. Alimentos geneticamente modificados (soja, trigo, arroz) são produzidos em massa. Oferecem aumento de produtividade, menor preço, resistência às pragas, menor tempo para a produção, novos organismos vegetais. Tudo com um sentido: combater a fome no mundo. Porém, as duas grandes dúvidas permanecem: consequências ambientais e na saúde humana. Algo sem resposta até o momento; nenhuma garantia que isso não venha acontecer. Quanto à fome, não parece que a questão seja a produção. Pois, a humanidade, nunca produziu tantos grãos. E, nem por isso, a fome, no mundo, diminuiu o suficiente para que possamos dormir em paz. Para diminuir a fome, as pessoas devem ter acesso à educação e renda. Voltando à cerveja: no Brasil, a lei permite a utilização de outros cereais, além da cevada, para sua produção. Na atualidade, a cerveja fabricada no Brasil contém cerca de 50% de milho ou outros cereais. Com isso a produção fica bem mais barata. Sendo o Brasil o segundo maior produtor mundial de alimentos transgênicos, atrás apenas dos Estados Unidos, há de ser supor que consumimos a cerveja transgênica. Por que a suposição? Porque o que esclarece são as informações dos rótulos. E, estes, no Brasil, não são nada esclarecedores. Muito pelo contrário, permanecemos, os consumidores, sempre em dúvida.





Sergio Damião Santana Moraes

quarta-feira, 3 de maio de 2017

Andarilho

Caminhava pelo canto da estrada, pelo acostamento de uma Br, em estrada sem acostamento e por muitas outras estradas. Caminhava... Não existia destino. Não existia início ou fim. Impossível saber seu rumo. Um vazio na mente, apenas os músculos como impulsores. Esses são os verdadeiros andarilhos. Da janela do carro seguia seus passos. Apesar do conforto em que me encontrava, invejava a liberdade. Livre das escolhas. Seguia o coração. Mas, logo a realidade da imagem se sobressai. São cabelos alvoroçados, uma longa barba, roupas rotas e pele recoberta de terra, lembrava um mendigo do centro de uma cidade grande, são os mendigos da beira da estrada. Nada pedem, nem mesmo alimentos, são em sua maioria doentes mentais – alienados. Vivem sujeitos a toda má sorte, doenças e vulneráveis as agressões. Em um centro de cidade seriam pedintes, conquistariam bens materiais. Preferem a liberdade, como um passarinho em busca da natureza. Sergio Fava, psiquiatra cachoeirense, acompanhou muitos deles através de sua câmera, fotografava andarilhos de Vitória até Bom Jesus do Norte. Tempos atrás, ele me disse: “Podemos ampliar a liberdade deles, podemos curá-los.” Em outras palavras: “A liberdade é a cura.”
Tempos atrás, encontrei em leito do hospital um homem que se apresentava esfarrapado – um maltrapilho. Logo houve a confirmação: tratava-se de um andarilho. Suas condições físicas não eram das melhores. Um Acidente Vascular Cerebral (Derrame cerebral) deixou-o sem voz e a força de um dos lados do corpo, além da perda da função dos rins. Permaneceu no hospital um longo tempo, tempo maior que o necessário para a recuperação física, por conta da necessidade de encontrar seus familiares. Uma irmã assume seus cuidados, para tanto constrói pequeno cômodo em sua residência. Pronto, estava sendo cuidado, cercado de atenções, não se encontrava mais sozinho. Ainda no hospital, apesar de não falar, não movimentar um dos lados do corpo, parecia tudo entender e dava sinais de melhoras clínicas. Ficava a impressão de estar agradecido, embora permanecesse um ar de tristeza. O que se passava em sua mente? Certamente a saudade da estrada, da liberdade de caminhar, a saudade dos caminhões, dos pássaros. Ou, simplesmente, voltara à realidade da vida humana - realidade da prisão ao leito. Procurava entender seu desejo. Não havia resposta. Tempos depois, soube de sua morte. A irmã informou que em seus últimos dias recusava alimentação e água, “morreu como um passarinho”. Ela contou em seguida: “Em seu último suspiro eu vi um sorriso, parecia flutuar sobre uma linda estrada iluminada. Ele seguia em frente como um desbravador de tempos nublados, e tristes, dos nossos dias.”




Sergio Damião Santana Morares

Um pouco de poesia...

De Murilo Mendes, Canção do exílio: “Minha terra tem macieiras da Califórnia/ onde cantam gaturamos de Veneza./ Os poetas da minha terra/ são pretos que vivem em torres de ametista,/ os sargentos do exército são monistas, cubistas,/ os filósofos são polacos vendendo a prestações./ [...] Nossas flores são mais bonitas/ nossas frutas mais gostosas/ mas custam cem mil réis a dúzia./ Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade/ e ouvir um sabiá com certidão de idade!”

Samarina

São vinte anos de idade. Há muito que se comporta como se a maioridade possuísse. Apresenta-se com uma cintura fina, tronco forte e largo. Elegantemente coberta. Veste-se diferente, um verde claro constante. Uma beleza exuberante! Quem a conhece apaixona-se à primeira vista. Diferente de todas as outras, é silenciosa. Prefere ser observada.  Transmite tranquila alegria. Muitos foram os homens que se apaixonaram. Mesmo assim, as mulheres não sentem ciúmes. Pelo contrário, nutrem um sentimento de admiração e incentivam a paixão. Reside numa praça, no alto do morro do bairro Gilberto Machado, morava com os macacos e cuidava como seus filhos, eles se foram (por isso, também chamada, Praça dos Macacos). Protege a praça dos ventos, da chuva e do sol. Pela manhã com os primeiros raios de luz podemos ver os reflexos em seu tronco esverdeado. O ir e vir dos macacos cativava as crianças, adolescentes e adultos que procuravam descanso. Foi na busca de descanso que encontrei um morador antigo aproveitando o regalo de fim de tarde em uma das partes da grande árvore. Falou do nascimento, na verdade uma muda trazida de uma das viagens de empresário cachoeirense, que a ele juntou-se um médico, e juntos a plantaram no local. Como em um parto, a irmã gêmea, a outra muda, foi transportada para o final da Beira-Rio. Daquele dia em diante, Jonas, o morador antigo, tornou-se guardião da Samarina. Nome estranho que o Jonas aprendeu anos depois, com um estrangeiro entendido do assunto.
Algum tempo atrás, após vento forte e arrasador, parte do corpo tombou, pensaram no fim da Samarina, foi contida com uma “tipóia”. Uma operação realizada pelos moradores, que na ocasião eram poucos. Sorte nossa, cresceram ramos fortes, rentes a terra. Hoje, seus ramos e galhos permitem um passeio pelo seu interior. Sementes e flores são admiradas – são os Samalheiros. A força de seus ramos, a delicadeza de suas sementes, traz a harmonia e nos faz voltar ao tempo de infância. Ao lado da casa onde nasci: pés de carambolas; na rua que chegava ao mar, o de jenipapo; junto às pedras do mar do Cais do Avião, as mangueiras... A Praça dos Macacos que abriga nossa árvore australiana, apesar da admiração que desperta, pode desaparecer. De tudo que se observa na árvore, o melhor é sentir a liberdade de se sentar à sua sombra. Na Praça da Samarina caminha-se em sua volta como um grande abraço. Sente-se seu perfume, admira-se sua altura, seu porte, sua resistência às intempéries. À sombra dessa árvore é possível pensar em coisas simples e boas. Dia desses, uma boa notícia, dois pequenos macacos (Saguis) encontravam-se pendurados nos fios que encobrem a Avenida Francisco Lacerda de Aguiar. A volta dos Saguis significa vida longa para a nossa Samarina e alegria para a nossa praça.

Sergio Damião Santana Moraes


Um pouco de poesia...

De Augusto dos Anjos, Versos íntimos: “Vês! Ninguém assistiu ao formidável/ Enterro de tua última quimera./ Somente a Ingratidão – esta pantera -/ foi tua companheira inseparável!/ Acostuma-te à lama que te espera!/ O homem, que, nesta terra miserável,/ Mora, entre feras, sente inevitável/ Necessidade de também ser fera/ Toma um fósforo. Acende teu cigarro!/ O beijo, amigo, é a véspera do escarro,/ A mão que afaga é a mesma que apedreja./ Se a alguém causa inda pena a tua chaga,/ Apedreja essa mão vil que te afaga,/ Escarra nessa boca que te beija!”