Caminhava pelo canto da estrada,
pelo acostamento de uma Br, em estrada sem acostamento e por muitas outras
estradas. Caminhava... Não existia destino. Não existia início ou fim. Impossível
saber seu rumo. Um vazio na mente, apenas os músculos como impulsores. Esses são
os verdadeiros andarilhos. Da janela do carro seguia seus passos. Apesar do
conforto em que me encontrava, invejava a liberdade. Livre das escolhas. Seguia
o coração. Mas, logo a realidade da imagem se sobressai. São cabelos alvoroçados,
uma longa barba, roupas rotas e pele recoberta de terra, lembrava um mendigo do
centro de uma cidade grande, são os mendigos da beira da estrada. Nada pedem, nem
mesmo alimentos, são em sua maioria doentes mentais – alienados. Vivem sujeitos
a toda má sorte, doenças e vulneráveis as agressões. Em um centro de cidade seriam
pedintes, conquistariam bens materiais. Preferem a liberdade, como um
passarinho em busca da natureza. Sergio Fava, psiquiatra cachoeirense,
acompanhou muitos deles através de sua câmera, fotografava andarilhos de
Vitória até Bom Jesus do Norte. Tempos atrás, ele me disse: “Podemos ampliar a
liberdade deles, podemos curá-los.” Em outras palavras: “A liberdade é a cura.”
Tempos atrás, encontrei
em leito do hospital um homem que se apresentava esfarrapado – um maltrapilho.
Logo houve a confirmação: tratava-se de um andarilho. Suas condições físicas
não eram das melhores. Um Acidente Vascular Cerebral (Derrame cerebral)
deixou-o sem voz e a força de um dos lados do corpo, além da perda da função
dos rins. Permaneceu no hospital um longo tempo, tempo maior que o necessário
para a recuperação física, por conta da necessidade de encontrar seus
familiares. Uma irmã assume seus cuidados, para tanto constrói pequeno cômodo
em sua residência. Pronto, estava sendo cuidado, cercado de atenções, não se
encontrava mais sozinho. Ainda no hospital, apesar de não falar, não movimentar
um dos lados do corpo, parecia tudo entender e dava sinais de melhoras clínicas.
Ficava a impressão de estar agradecido, embora permanecesse um ar de tristeza.
O que se passava em sua mente? Certamente a saudade da estrada, da liberdade de
caminhar, a saudade dos caminhões, dos pássaros. Ou, simplesmente, voltara à
realidade da vida humana - realidade da prisão ao leito. Procurava entender seu
desejo. Não havia resposta. Tempos depois, soube de sua morte. A irmã informou
que em seus últimos dias recusava alimentação e água, “morreu como um
passarinho”. Ela contou em seguida: “Em seu último suspiro eu vi um sorriso, parecia
flutuar sobre uma linda estrada iluminada. Ele seguia em frente como um
desbravador de tempos nublados, e tristes, dos nossos dias.”
Sergio
Damião Santana Morares
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