Neste verão,
Cachoeiro encontra-se diferente. Em fim de dezembro, início de verão, o rio
Itapemirim transbordou. Mais uma enchente em nossa história. A cidade em
polvorosa discutia a enchente de maior intensidade, a lembrança da enchente dos
anos 30 e 40 sempre retorna. Aquela que Rubem Braga descreve, com jeito de
menino travesso, em suas crônicas. Mas, a nossa enchente, a do século XXI, a
mais recente, tem lá suas travessuras e beleza. É sempre assim, com a cheia do
rio, ficamos em dúvida, se cuidamos da cidade e das pessoas ou observamos o
rio. Cuidamos das pessoas e corremos ao rio. Entre o rio e a cidade, ficamos
com o rio. Na verdade, ao escolhermos o rio, damos vida à cidade, pois, o rio é
a razão da existência da cidade. Os bens materiais, substituímos; para o rio
não há substituto. Sem o rio, não existiremos. Ontem: eu vi uma folha seca. Não
era uma simples folha. Eram muitas folhas secas, estavam abaixo das árvores da
Avenida Francisco Lacerda de Aguiar e na Rua Rui Barbosa, em Cachoeiro de
Itapemirim. Curioso, nas árvores, não se apresentavam folhas secas, elas
estavam verdes, como o esperado e desejado. O vento, de tempo em tempo,
derramava as folhas, elas por ação do sol ou pelo calor do nosso asfalto,
rapidamente desidratavam. Não só as folhas das árvores comuns, mas as flores
menores do Ipê amarelo. Todas juntas aos meus pés. Olhei a mistura de flores e
folhas e segui em frente. Busquei o rio Itapemirim no centro da cidade. Era fim
de tarde, por vários momentos parava, voltava o olhar ao chão, em alguns
instantes eu entristecia: a beleza anterior de folhas e flores pelas ruas da
nossa cidade era substituída pelo lixo. A sujeira pela terra deixada pela última
cheia do rio e pelo temporal. Caminhei, o rio me alegraria. Após as chuvas torrenciais
do fim de dezembro, após vários dias do Itapemirim transbordante, voltamos às
preocupações pela seca. Não guardamos a água. Elas chegaram e se perderam em
direção ao mar. A folha seca que eu vi ao descer o morro do Gilberto Machado
lembrou-me um amor perdido: uma “folha morta”. Era uma imagem triste, uma folha
solitária, como uma pessoa que perde uma grande paixão. Entre as folhas secas e
mortas sobressaiam-se as flores amarelas dos Ipês, com elas, a esperança do
amor sobrevivente.
Em nossa história,
a folha seca foi motivo de comemorações. Didi, da seleção brasileira, chutava e
a bola fazia piruetas no ar (tal qual uma folha ao vento), ganhava a meta
adversária em mais um gol do Brasil. Era a década 50/60 do século passado. As
folhas secas, das ruas cachoeirenses, chegaram mais cedo neste ano. Intrigante,
está misturada à terra deixada pelas chuvas e pela cheia do Itapemirim. As
folhas secas das nossas ruas, por breve instante, lembram uma “folha morta” de
um fim de amor. Quando olhamos atentamente, faz lembrar a folha de uma página
de livro; quando virada, um novo mundo se apresenta.
Sergio Damião Santana Moraes
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