domingo, 11 de dezembro de 2016

Mistérios

Dos muitos mistérios da minha infância, o que mais me intrigava era o pé da minha avó que não preenchia por inteiro o sapato ou chinelo e, por isso mesmo, consumia a parte lateral dos calçados. Também, as missas e vestimentas franciscanas de Santo Antônio que ela me fazia vestir em 13 de junho e desfilar pelo bairro da Ilha de Vitória. Outros pequenos e grandes mistérios me seguiram na idade adulta. Apesar das muitas dúvidas que minha avó me deixou, a maioria foi com coisas alegres e divertidas.  Uma dessas era a venda de alguns quilos, que a mãe do meu pai, em uma atitude caridosa realizava. Certa vez, ela me achou muito magro, o que era uma verdade, e resolveu me passar algumas gorduras. Com certa resistência entreguei as minhas poucas moedas de um cofre, que guardava com muito zelo e carinho, repassei ao primeiro mendigo que encontrei em frente à nossa casa. Entreguei apesar de ele nada entender, e por isso mesmo nem agradecer, repassei como fora recomendado, com formalidade ao primeiro transeunte, na esperança do ganho de alguns quilos. Para minha tristeza, constatei que as poucas moedas foram usadas no bar da esquina em troca de uma pinga. Acho que a simpatia foi quebrada pela cachaça. Pois, passei toda minha adolescência na magreza. Falava, também, sobre seu santo preferido, Santo Antônio, dizia que nascera em Lisboa, chamava-se Fernando, para os ibéricos significa ardoroso na paz. Transformou-se em Antônio de Pádua, em homenagem à cidade italiana escolhida para viver e morrer.
Nos dias atuais, procuro me distanciar dos mistérios, prefiro as coisas que compreendo e entendo com facilidade. Um assunto instigante é o transcendentalismo. Em certa ocasião acompanhei várias respostas para a transcendência. Entre homens e mulheres houve uma quase unanimidade: Deus, como resposta. Silenciei. Apenas ouvi. Dia desses, apresentei-me a um desconhecido, rapidamente começamos a conversar e logo parecíamos amigos de longa data. A conversa não era inteligente e nem de assuntos complicados, mas fluía sem necessidade de medir palavras, sem preocupação de agradar. Quem sabe a amizade, seja a resposta. Com o horário de verão, desperto ainda na escuridão. Logo, por cima do Itabira o clarão do amanhecer aparece e com ele um vermelhão se apresenta acima dos morros. Assim, presencio um momento especial da natureza, o nascer do dia. Penso... Será isso a transcendência?

Sergio Damião Sant’Anna Moraes

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