Do
moçambicano, Mia Couto, em poemas escolhidos, Flores: “Ninguém/ oferece
flores./ A flor,/ em sua fugaz existência,/ já é a oferenda./ Talvez,
alguém,/ de amor,/ se ofereça em flor./ Mas só a semente/ oferece
flores.”
domingo, 25 de setembro de 2016
Prisioneiro do Mar
Encontrava-se
agitado. Não conseguia comunicar-se com as pessoas em sua volta. Sentia-se
distante, solto no ar, no espaço, no universo. Na mente, buscava o infinito.
Talvez fosse essa a explicação para a escolha de sua moradia preferencial - o
mar. Em alto-mar sentia-se livre. A pesca aliviava suas tensões, apagava seus
conflitos e acalmava seu espírito. Fora dali não o entendiam. Em terra firme,
confiná-lo no manicômio foi a solução. Em terra firme incomodava a sociedade.
Amedrontava os vizinhos e envergonhava os familiares. Internado permaneceu.
Longo tempo, dias, meses... Tão longo que perdera a noção do dia e da noite. Não
entendiam suas necessidades e carências. A cada agitação, a cada grito, mais reação.
Remédios, novas drogas. Falava, mas não escutavam. Pedia ajuda, chamava pela
mãe, pai, irmãos, não era atendido. Não ouviam o grito dos excluídos
mentalmente. Foi esquecido pela sociedade, pela família. Continuava gritando,
cada dia mais forte. Cada dia mais alto. Quem sabe assim passariam a ouvi-lo.
Agredia. Procurava chamar a atenção. Algo incomodava. Eram lembranças
estranhas. Em sua memória não enxergava a mãe, não encontrava o pai, nem
identificava os irmãos. Em suas lembranças encontrava-se sozinho. A solidão
assustava.
Os remédios
ajudaram por um breve tempo - curto tempo. Suficiente para rotularem como
melhoras - a volta da lucidez e a normalidade. Logo percebera a realidade.
Enxergava no pátio a presença de muitos pais, muitas mães, muitos irmãos, menos
os seus. Foi o bastante. Uma nova onda. Novos tremores. Nova agitação.
Amarrado, contido no leito, permaneceu. Os remédios não mais aliviavam a tensão,
agitava-se mais e mais. Sentia saudade; sentia saudade do mar. Temia o choque.
Uma alternativa terapêutica já experimentada. Queria o mar. Temia o choque:
crescera com ele. Desde a adolescência sentira o choque das agressões
físicas. Crescera com as agressões físicas dos pais. Crescera com o desprezo
dos pais. Buscava o mar. Queria o mar de sua infância, da sua adolescência.
Queria tocar a areia branca e quente, queria caminhar em direção à onda do seu
mar. Sonhava... Ele criança sendo carregado pelo irmão em areia macia, branca e
quente. Sonhava com os pais... Nunca entendera as agressões sofridas em casa. Não
aceitavam suas diferenças. Era diferente das outras crianças, dos irmãos e dos
outros adolescentes. E agora, dos outros adultos. Tornara-se um adulto
diferente. Procurava uma razão: não encontrava. Uma explicação: nada, só o silêncio.
Procurou ajuda, não encontrou. Encontrava-se sozinho, solitário. Tentava falar:
não era ouvido. Por fim, buscou o mar, bem no fundo. Onde morava a melhor
lembrança. Foi acolhido.
Sergio Damião Santana Moraes
Um pouco de poesia...
Sonetos Portugueses, Fernando Pessoa: “Em torno a mim os mortos
esquecidos/ Volveram todos. Eu em sonho os vi./ Se os amei, como foi que
os esqueci?/ Se os esqueci, como foram queridos?/ Rápida vida, como os
fizeste idos!/ Com que fria memória os lembro aqui!/ Já desleixo chorar o
que perdi,/ Lembro-os longe da sombra dos sentidos./ Quando os perdi,
pensei: Cada momento/ Me lembrará sua presença morta,/ Eterna em meu
constante pensamento./ Mas lentamente a vida fecha a porta./ Fechada
toda, o olhar está desatento./ Para longe de Deus quem me transporta?”
Sociedades Secretas
Existem desde
os primórdios da humanidade. As crenças místicas de muitas sociedades secretas
se baseavam nos ensinamentos herméticos. Isto é, o mundo material é um reflexo
do espiritual. É a ideia básica do esoterismo dos antigos egípcios, do
gnosticismo, da cabala. Para os egípcios, Osíris foi o Deus que transcendeu a
morte e por isso relacionado a todos os aspectos de suas vidas (Ele julgava o
morto conforme suas ações terrenas – estimulava o desenvolvimento da
consciência ética e as normas de boa conduta). Os ritos de iniciação secreta
grega eram estreitamente ligados às ideias de vida após a morte, pretendiam
assegurar uma existência feliz após a passagem terrena. Três eram os mistérios
gregos: Eleusinos, Dionísicos (Baco) e Órficos. Para os gregos, Dionísio era o
Deus da alma, das árvores e da vida. O pinheiro é o que o melhor representava.
Os Órficos acreditavam na metempsicose e em recompensas e punições para o
espírito, conforme os méritos ou não em pessoa física. A filosofia grega foi um
processo pelo qual, as concepções religiosas originais do Universo e mitos
foram crescentemente racionalizadas. Os Essênios: uma antiga e obscura
comunidade religiosa judaica, uma possível relação com Jesus e seus
ensinamentos. Em 1947 foram descobertos os manuscritos do Mar Morto. A Gnose
remete aos primeiros cristãos, aos retiros dos ascetas que se isolavam na
Palestina e Egito em busca de conhecer Deus (a busca da centelha divina - a luz
que nos habita). O gnosticismo foi influenciado pelo Zoroastrismo da Pérsia.
Grande parte dos gnosticistas místicos eram ligados a Tiago - irmão consanguíneo de Jesus. Pitágoras,
filósofo grego, exerceu enorme influência no pensamento ocidental. Mais ainda
na Renascença. Para o pitagorismo a essência das coisas é o número, as relações
matemáticas. Dizia: “Deus usa a matemática para escrever o Universo.” A
matemática, geometria e a música são a base da expressão do pitagorismo.
Poucas ordens
religiosas foram tão envolvidas em mistérios como a Ordem dos Cavaleiros do Templo
de Salomão ou dos Templários. Fundados na França durante a primeira Cruzada
para tomar Jerusalém dos muçulmanos (1095-1099). No séc. 14, devido a
Inquisição, dispersaram. Mas, por toda Europa, difundiram suas tradições
místicas, inovações arquitetônicas (construção de Catedrais) e conhecimentos
navais. O último Grão-Mestre Templário foi Jacques DeMolay. A maçonaria não é
uma sociedade secreta. Pois, possui registro civil, local para suas reuniões,
seus membros são conhecidos e respeitados na sociedade. Também, não é uma
religião. Ela é uma sociedade iniciática (transmite seus conhecimentos e ensinamentos
de forma organizada para aqueles que assim o desejam). Tem como objetivo a
evolução social de toda humanidade, com tolerância às diferenças.
Sergio
Damião Santana Moraes
sexta-feira, 9 de setembro de 2016
Um pouco de poesia...
Do
poeta cachoeirense Newton Braga, em Lirismo Perdido, “O mal que te
desejo”: “Bem sabes que, se um dia, na estrada da vida,/ o destino me
destacasse entre os humanos,/ como um eleito sobrenatural,/ e colocasse
ao alcance de minhas mãos vazias/ a flor raríssima e sonhada/ que os
homens chamam de felicidade,/ eu a colheria, carinhosamente,/ e iria
depositá-la a teus pés,/ como oferenda de meu pobre amor./ [...] No
entanto, eu te desejo um mal,/ eu te desejo um sofrimento enorme, sem
remédio:/ - perdoa: que tu sentisses, de mim,/ a saudade que sinto de
ti.”
Setembro Amarelo e Verde
Setembro é um
mês diferente. Inicia a primavera, lembra as flores. Lembrança da pintura do
florentino Sandro Botticelli e o Nascimento de Vênus. A deusa do amor e beleza em uma concha sobre
as espumas do mar em meio às pétalas de rosas. Em Cachoeiro, mês dos ipês e
flamboyants, mudanças de cores e nas nossas emoções. Coisas subjetivas, que nos
leva a pensar na vida. Nada mais oportuno que, usar este mês para campanhas
pelo Brasil afora: prevenção do suicídio (Setembro Amarelo), isto é, evitar a
morte; e, também, o Verde para doar órgãos e tecidos (órgãos sólidos – rim,
coração, pulmão, fígado; tecidos e células – doação de sangue e córnea).
Setembro Verde para promover a vida. Setembro nos faz solidários. O altruísmo,
devido o amor e beleza, fica à beira da pele. Com isso pensamos no outro, em
sua angústia, sua dor não física, seu desespero. O suicídio é uma causa de
morte traumática crescente em todo o mundo, no Brasil inclusive. As causas são
variadas: doenças psiquiátricas (depressão, esquizofrenia, transtorno do
humor), causas comportamentais e estilo de vida, dificuldades financeiras, uso
abusivo de álcool e outras drogas... O
suicídio tem o preconceito como um dos maiores obstáculos para diminuirmos sua
incidência. A sociedade, bem como os familiares do suicida, se esconde. Não se
conversa sobre o assunto. Interessante que, ao falarmos com uma pessoa que
tentou o suicídio, horas ou dias depois do acontecimento, ele ou ela não mais
manifesta o desejo de ceifar a vida. Porém, não é uma garantia de que as
tentativas não mais acontecerão. Pelo contrário, logo em seguida a uma
tentativa, são momentos que devemos ficar mais atentos. Familiares e equipe de
saúde mental devem aumentar a vigilância. Que o amarelo das pinturas de Van
Gogh, um artista que ceifou a vida, nos alerte sobre a prevenção. No Brasil, o
dia do alerta é 10 de setembro.
Além de
Amarelo, o mês é Verde. Mais que prevenir a morte, podemos doar vida, mesmo
após a morte. A doação de órgãos e tecidos permite isso. Ainda que a
paralisação completa da circulação e até do coração aconteça. A vida pode ser
estabelecida em outra pessoa. Uma obra maravilhosa dos homens. A ciência em
favor do corpo humano. Por isso, a comemoração em 27 de setembro, dia de Cosme
e Damião, os Santos católicos, protetores dos transplantados, considerados os
primeiros médicos a realizar um transplante. Um milagre da idade média. A vida
em vida: doadores de sangue. Esquecemos, frequentemente, que essa é uma das
ações mais solidárias. A doação em vida, doar sangue para parente próximo ou
para um desconhecido e rim para um parente. Depende da nossa vontade. A doação de outros órgãos, após a morte,
depende de manifestar o desejo em vida e comunicar aos familiares. Portanto a
ação solidária é parte da nossa consciência. Depende de nossa decisão. A doação
de córneas deve ser incentivada. Permitir a recuperação da visão do amarelo e
verde. Enxergar o Outubro Rosa, Novembro Azul e o branco da paz de dezembro,
janeiro...
Sergio
Damião Santana Moraes
sexta-feira, 2 de setembro de 2016
Um pouco de poesia
De Florbela Espanca, poetisa portuguesa do início do século XX, “É um
não querer mais que bem querer”: “São mortos os que nunca acreditaram/
Que esta vida é somente uma passagem,/ Um atalho sombrio, uma paisagem/
Onde os nossos sentidos se poisaram./ São mortos os que nunca
alevantaram/ De entre escombros a Torre de Menagem/ Dos seus sonhos de
orgulho e de coragem,/ E os que não riram, e os que não choraram./ [...]
Sobem-me aos lábios súplicas estranhas.../ Sobre o meu coração pesam
montanhas.../ Olho assombrada as minhas mãos vazias...”
Vi Ver Unimed
As ações
sociais, o comprometimento comunitário de uma empresa, tornam-se essencial em
nosso país. Uma realidade em empresas do mundo inteiro. Em nossa região a
Cooperativa Médica Sul Capixaba - Unimed se sobressai nos 30 municípios sulinos.
Em Cachoeiro de Itapemirim, nos últimos meses, o Núcleo Feminino Cooperativista
se destaca. As mulheres – médicas, colaboradoras e esposas de médicos
cooperados vão fazendo a diferença. Um projeto chama a atenção, significativo
para as crianças, e de grande alcance humano e social: identificar crianças do
ensino fundamental com deficiência visual. Um trabalho das mulheres da
Cooperativa Médica Sul Capixaba em parceria com a Secretaria Municipal de
Educação. Realizado, inicialmente, na Escola Florisbelo Neves – Novo Parque. Com
o apoio da diretora (Elisângela Chamon) e professores da Escola Florisbelo,
após treinamento dos mestres, foram triados 449 alunos e identificadas 58
crianças para consulta oftalmológica na Unimed. O Grupo Unimed (Médicas: Fabiola,
Delmontina, Stélida, Ermelinda e Regina; Esposas de cooperados: Paula e
Marilza; Colaboradoras: Paula Matielo, Fátima Chicon, Rita Martins, Janete,
Paula – da Casa do Cooperado e Aline) vão se revezando nos cuidados às
crianças. Parece que, cuidar de outra pessoa, doar o tempo que muitas vezes não
temos, satisfaz mais a quem cuida do que a quem é cuidado. No dia a dia, doa
quem não tem tempo; aqueles que o tem, perde-se em divagações que o leva a angústia.
Os sem tempo aproveitam cada minuto, cada segundo, e os transforma em ações. A
retribuição não é em palavras, e sim, em olhares, um olhar de gratidão. Uma das
primeiras crianças a receber o óculos apresentava uma deficiência visual
importante, até então não identificada, quando recebeu as lentes, disse:
“Mãe... Eu vou poder ver a lua!” Era um final de tarde, a noite se chegava, com
o crepúsculo, o céu apresentava as primeiras estrelas, a lua se insinuava. Da
varanda do auditório da Unimed, ele enxergou a lua em detalhes e se encantou.
Naquela noite encantada, ele sonhou com o satélite e com o restante dos astros.
No dia seguinte veria com nitidez as letras do seu livro.
Os projetos
sociais, de forma particular ou de empresas, não são fáceis de manter. Muitos
são os empecilhos: amadorismo, relacionamentos conflituosos, até as coisas do
ser humano – invejas, intolerâncias... Coisas que não deixam o bem se
concretizar. Mas, de tudo, acho que a motivação, o altruísmo, deve se impor. A
ação social existe pela necessidade do ser humano em realizar o bem. Agir como
o colibri em um incêndio de floresta. Em seu bico uma gota d´água. Não importa
o tamanho da ação, e sim, o que ela desencadeia nos nossos sentimentos e nas
outras pessoas. Assim como a criança demonstrou satisfação em ver a lua. Quando
criança, junto ao meu pai, eu pedi: Pai... Ajude-me a enxergar o mar! Foi quando
despertei para a beleza das coisas da vida.
Sergio
Damião Santana Moraes
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